Quais narrativas (ou leituras) cruzaram o livro enquanto objeto em 2021? Pelo sexto ano, pedimos a nossos designers — Hana Luzia, Janio Santos, Guilherme de Lima, Rafael Olinto e Matheus Melo — e a alguns de nossos colaboradores e colaboradoras — Filipe Aca, Icaro Matias e Maria Luisa Falcão — que elegessem os trabalhos que mais chamaram a atenção entre os que foram lançados neste ano.
>> Filipe Aca, designer e ilustrador
Cartas a uma negra (Françoise Ega)
Editora: Todavia
Capa: Violaine Cadinot com pintura de Peter Uka
Comentário: A arte da capa não representa o sofrimento da personagem, mas a coloca como agente de força, denúncia e ativismo. Uma capa importante e inspiradora, já que essa mulher é protagonista de sua vida e conduz sua própria narrativa.
Correntes (Olga Tokarczuk)
Editora: Todavia
Capa: Flávia Castanheira com ilustração de Talita Hoffmann
Comentário: Adoro como a capa representa o movimento e a inquietude da narrativa. A história passa por diferentes museus de anatomia e medicina, porém os elementos escolhidos para compor a ilustração mostram que, além de um livro sobre viagem, é também sobre memória e afeto.
LaserWriter II: A novel (Tamara Shopsin)
Editora: MCD Books
Capa: Tamara Shopsin
Comentário: Eu amo como essa capa é simples e óbvia, mas ao mesmo tempo criativa e nostálgica. Ela é a página de testes de uma impressora, aquela que é produzida assim que instalada ou você precisa ver se está tudo funcionando bem. Acho que dá pra chamar de um ready-made gráfico.
Quincas Borba (Machado de Assis)
Editora: Antofágica
Capa: design de Pedro Inoue e Bruno Abatti, com ilustração de Samuel de Saboia
Comentário: Mais um ano e mais uma coleção de capas fantásticas lançadas pela Antofágica. Samuel de Saboia é hoje um dos maiores expoentes das artes visuais do Brasil. Muito bonita essa colaboração.
A visão das plantas (Djaimilia Pereira de Almeida)
Editora: Todavia
Capa: projeto gráfico de Luciana Facchini e arte de Willian Santiago
Comentário: Willian Santiago é um dos artistas e ilustradores que mais admiro e me inspira. Foi vítima da covid. Que bom que a sua vida e arte estarão eternizadas na capa de um livro tão importante, que também foi um dos melhores lançamentos do ano.
>> Guilherme de Lima, designer e ilustrador
Passados presentes (Rodrigo Patto Sá Motta)
Editora: Zahar
Capa: Celso Longo e Daniel Trench
Comentário: Uma capa forte pelas cores e pelo movimento explícito, a queda da bandeira - um golpe - conversando diretamente com o subtítulo.
O nariz (Nikolai Gógol)
Editora: Antofágica
Capa: Giovanna Cianelli com ilustrações de Nicholas Steinmetz
Comentário: Amo esse livro como um todo, as ilustrações em aquarela com intervenções digitais de Nicholas Steinmetz são perfeitas. Essa edição tem um projeto gráfico maravilhoso.
Loira suicida (Darcey Steinke)
Editora: Companhia das Letras
Capa: Bloco Gráfico
Comentário: Variando, aqui está uma fotografia. Amo a expressão vazia na personagem já deitada, com um ar bastante apático.
Sul da fronteira, oeste do sol (Haruki Murakami)
Editora: Alfaguara
Capa: Alceu Chiesorin Nunes
Comentário: Sempre gostei dos projetos da Alfaguara pro Murakami e amei, especialmente, essa capa.
Vento vadio: As crônicas de Antônio Maria (Antônio Maria)
Editora: Todavia
Capa: Mariana Newlands e Bruno Cordeiro Macedo
Comentário: Perfeita a decisão de pôr a obra de Santídio Pereira na capa de Vento vadio.
>> Hana Luzia, designer e ilustradora
Ubu Rei (Alfred Jarry)
Editora: Ubu
Capa: Elaine Ramos e Lívia Takemura (assistente)
Comentário: A capa e o projeto gráfico são primorosos, com ênfase na experimentação tipográfica e na produção gráfica, com destaque para os bolsos de papel formados por dobras não cortadas no acabamento de algumas páginas. Por ser uma edição especial, o livro possui encartes de registros gráficos relativos às produções de Ubu Rei no Brasil e no mundo, como ingressos, fotografias, ilustrações e manuscritos de Alfred Jarry, assim como ilustrações e gravuras de Picasso e Joan Miró, croquis de Lina Bo Bardi para montagem brasileira do Teatro do Ornitorrinco, entre outros. A capa é uma referência a um desses encartes do livro, o cartaz da montagem parisiense de 1946 feito pelo artista Raymond Savignac.
A estrangeira (Claudia Durastanti)
Editora: Todavia
Capa: Violaine Cadinot sobre pintura de Henrietta Harris
Comentário: A retórica da pintura, com o borrão sobre o rosto, sugere bem a inadequação da personagem como estrangeira. Além disso, a capa é belíssima.
Bolsonaro genocida (Vários autores)
Editora: Elefante
Capa: Túlio Cerquize
Comentário: Esta capa e projeto gráfico, para mim, destacam-se pela ousadia da proposta da orelha virar um stencil: um design radical que propõe uma ação aliada ao conhecimento. Como diria Sérgio Sampaio: "um livro de poesia na gaveta não adianta nada". Um livro sobre política também não.
O parque das irmãs magníficas (Camila Sosa Villada)
Editora: Tusquets Editores
Capa: ilustração de Paula Cruz
Comentário: A ilustração da capa traz uma solução bastante poética e fantasiosa (e nem um pouco óbvia) do universo travesti tratado na obra.
Satíricon (Petrônio)
Editora: Editora 34
Capa: projeto gráfico de Raul Loureiro e arte de Bruce Nauman
Comentário: Muito interessante a ideia dos tubos de neon para mostrar movimento e a diversidade de personagens, dentro do universo satírico e devasso da obra.
>> Icaro Matias, designer e cientista da religião
Véspera (Carla Madeira)
Editora: Record
Capa: Daniel de Jesus
Comentário: O poder hipnótico de uma simples imagem com grande impacto. Se deparar com esta capa é ser arrastado para o turbilhão de emoções contidas no livro. A imagem sempre me deixa absorto e o corte no centro da capa, que dá para um fundo laranja, nos deixa ainda mais intrigados com o que virá no livro.
Homens justos: Do patriarcado até as novas masculinidades (Ivan Jablonka)
Editora: Todavia
Capa: Júlio Dui com ilustração de Victor Arruda
Comentário: A austeridade da ilustração e a escolha das cores normativas para esta capa diante da temática do livro surpreende e deixa espaço para muitas reflexões.
Pequena coreografia do adeus (Aline Bei)
Editora: Companhia das Letras
Capa: Julia Masagão com ilustração de Louise Bourgeois
Comentário: É difícil escolher palavras para descrever esta capa. Os traços, que parecem ingênuos e infantis, compõem uma imagem potente, visceral e desconcertante.
As ondas (Virginia Woolf)
Editora: Autêntica
Capa: Diogo Droschi
Comentário: Parece que finalmente fez-se justiça à complexidade e beleza deste livro. Saindo da obviedade e literalidade do título da obra e traduzindo as camadas obscuras de nossa mente e multiplicidade dos personagens, certamente As ondas tem uma das capas mais belas deste ano.
Interseccionalidade (Patrícia Hill Collins e Sirma Bilge)
Editora: Boitempo
Capa: Flávia Bomfim (concepção e bordado)
Comentário: Este belíssimo trabalho manual que deu vida à capa deste importante livro para os estudos feministas não poderia estar de fora. O bordado foi uma perfeita escolha técnica para representar a temática do livro. No verso, podemos conferir as linhas entrelaçadas.
>> Janio Santos, designer e ilustrador
De memes e memórias (Leo Cunha)
Editora: Editora do Brasil
Capa: Rafael Nobre
Comentário: Uma capa que se destaca nas prateleiras físicas e virtuais. Gostei das ilustrações vetoriais, com multiplicação de pop ups e ícones do universo digital. Uma solução bem legal para ilustrar um livro de crônicas que bebe da inesgotável fonte que é a internet.
Marx: Ontem e hoje (Terrell Carver)
Editora: Zahar
Capa: Filipa Damião Pinto e Foresti Design
Comentário: O rosto de um dos pensadores mais influentes de todos os tempos é elegantemente perfilado com um simples traço. Detalhe para a disposição do título que complementa o olhar de Marx. Uma proposta minimalista e muito bem executada.
Antígona (Sófocles, com tradução de Millôr)
Editora: Paz & Terra
Capa: Leticia Quintilhano
Comentário: Trata-se de uma peça grega escrita por Sófocles há mais de 2500 anos. O confronto entre a personagem Antígona e seu tio, Creonte, é representado na capa de uma maneira caricata e cômica, o que também caracteriza a fonte escolhida. Um conjunto que certamente nos conecta com o tradutor da obra, o mestre Millôr Fernandes.
O golem (Gustav Meyrink)
Editora: Carambaia
Capa: Bloco Gráfico
Comentário: Embora lançado em e-book ainda no fim de 2020, a versão física foi disponibilizada no mês seguinte, já em 2021. O projeto do livro foi inspirado num estilo alemão contemporâneo à época do romance: o Plakatstil, com fontes em destaque, cores fortes e formas planas. A belíssima referência é concluída com a disposição do título, que, com o próprio nome e a forma, cria a gigante criatura da cultura judaica.
Seis balas num buraco só (João Silvério Trevisan)
Editora: Objetiva
Capa: Mateus Valadares
Comentário: O livro de Trevisan, lançado em 1998, vem com nova capa e edição atualizada. Achei pertinente a referência dos bonecos de caubóis (como símbolo da masculinidade tóxica) e da disposição do título. Destaque também para as cores escolhidas, desgastadas como a falácia do "homem ideal".
>> Maria Luísa Falcão, designer e pesquisadora
Tudo sobre o amor (bell hooks)
Editora: Elefante
Capa: projeto gráfico de Leticia Quintilhano e direção de arte de Bianca Oliveira
Comentário: Dentre os livros que li este ano, este tem uma das capas que mais me impactou – principalmente pelas cores marcantes, mas também pela tipografia e organização dos elementos gráficos. Esteticamente falando, o projeto gráfico deste e dos outros livros da coleção me agrada bastante.
Quincas Borba (Machado de Assis)
Editora: Antofágica
Capa: design de Pedro Inoue e Bruno Abatti, com ilustração de Samuel de Saboia
Comentário: Gosto muito da premissa da Antofágica – reapresentar os clássicos em edições caprichadas – e, no caso de Quincas Borba, ficou interessantíssima a abordagem voltada para as artes visuais. Me chama a atenção a alusão às texturas dos materiais, na ilustração e na capa, em geral. O resultado é muito agradável ao olhar.
Tramas de meninos (João Anzanello Carrascoza)
Editora: Alfaguara
Capa: Elisa von Randow
Comentário: Sempre me intriga o modo como materiais são utilizados, ou representados, em projetos editoriais. No caso desta capa, me interessou a referência à linha e ao bordado; a intenção de, no projeto gráfico, trazer uma técnica tão material e física. Vejo como uma solução bonita e instigante.
Um século de Clarice Lispector: Ensaios críticos (Yudith Rosenbaum; Cleusa Rios P. Passos [orgs.])
Editora: Fósforo
Capa: Luciana Facchini
Comentário: De início, esta capa captura o olhar por meio de fotografias aliadas a cores marcantes. A sobreposição de linhas curvas, além da tipografia, torna bastante interessante a organização dos elementos nesse projeto gráfico. No geral, a composição me parece consistente e impactante.
Macunaíma, o herói sem nenhum caráter (edição de artista) (Mário de Andrade)
Editora: Ubu
Capa: Luiz Zerbini
Comentário: Edição de artista lançada neste ano pela Ubu. A sobrecapa é composta por gravuras originais de Luiz Zerbini, feitas em monotipia e impressas a partir de elementos orgânicos como folhas, galhos e outros. Além do explícito apelo estético e material, é possível utilizar este caso para pensar questões como o artesanal em projetos editoriais. É, de fato, uma edição impressionante, em que cada exemplar é único.
>> Matheus Melo, designer, fotógrafo e publicitário
Amanhã teremos outros nomes (Patricio Pron)
Editora: Todavia
Capa: Celso Longo
Comentário: A conexão entre o título da obra e a fotografia de uma cama de quarto de hotel chama atenção pela simplicidade e conexão direta ao tema da obra, que discute afetos contemporâneos.
A visão das plantas (Djaimilia Pereira de Almeida)
Editora: Todavia
Capa: projeto gráfico de Luciana Facchini e arte de Willian Santiago
Comentário: A composição dos elementos morte, solitude, noturno e plantas é bem trabalhada em um projeto ilustrado que traduz os paralelos do livro - que viaja em uma história de amor e guerra.
Passados presentes (Rodrigo Patto Sá Motta)
Editora: Zahar
Capa: Celso Longo e Daniel Trench
Comentário: A capa chama atenção por representar, com clareza, a decadência do estado democrático durante o golpe de 1964, através da desconstrução da bandeira/identidade nacional - o que pode ser facilmente associado ao cenário político brasileiro atual.
A estrangeira (Claudia Durastanti)
Editora: Todavia
Capa: Violaine Cadinot sobre pintura de Henrietta Harris
Comentário: A ilustração "borrada" da capa representa o sentimento vivido pela protagonista do livro, que vive buscando um lugar de pertencimento. A realidade de imigrante é demonstrada com simplicidade e reflexão já na capa.
Caixa J. D. Salinger (J. D. Salinger)
Editora: Todavia
Capa e projeto gráfico: Pedro Inoue
Comentário: Projeto que agrega luxuosidade e minimalismo à obra emblemática de um dos maiores escritores dos Estados Unidos. O compilado de quatro obras é apresentado num box elegante que salta aos olhos em qualquer prateleira.
>> Rafael Olinto, designer e ilustrador
Brimos: Imigração sírio-libanesa no Brasil e seu caminho até a política (Diogo Bercito)
Editora: Fósforo
Capa: Alles Brau com ilustrações de Nina Farkas
Comentário: O que mais curti na composição gráfica foi a colagem e a brincadeira com o uso de cores.
Continuo preta (Bianca Santana)
Editora: Companhia das Letras
Capa: Vinícius Theodoro
Comentário: A capa me chamou atenção de primeira pelo uso da Cooper Black como fonte principal, lembrando o design e ativismo negro nos EUA. Além das cores harmônicas e a imagem em preto e branco, como eram feitos os cartazes na época da luta a favor dos direitos civis dos negros nos Eua.
O 13 de Maio (Astolfo Marques, organização de Matheus Gato)
Editora: Fósforo
Capa: Alles Blau com ilustração de Romildo Rocha
Comentário: Tanto a ilustração do tocador de Tambor de Crioula quanto a dançarina criada pelo artista e designer maranhense Rocha me lembraram a arte de xilogravura muito recorrente no Nordeste.
Casa de alvenaria - Volume 1: Osasco (Carolina Maria de Jesus)
Editora: Companhia das Letras
Capa: Estúdio Daó (Giulia Fagundes com pintura de Lucia Laguna)
Comentário: A obra, Paisagem, transmite uma sensibilidade de conforto como se estivesse no quintal de casa.
Esforços olímpicos (Anelise Chen)
Editora: Todavia
Capa: Ana Heloisa Santiago
Comentário: Gostei do uso de formas geométricas, das cores e da imagem - e da dinâmica feita com elas para compor a capa.